O Japão consegue dominar a “diminuição populacional e a sociedade muito envelhecida”
Por Yasushi Noguchi – Cônsul-geral do Japão em São Paulo
No dia 1º de maio, houve a entronização de Sua Majestade o Imperador do Japão e assim o país iniciou a era “Reiwa”. Além disso, o Japão chama a atenção do mundo com as Olimpíadas e Paralimpíadas de Tokyo a serem realizadas no próximo ano. Dentro dessa conjuntura, a maior incumbência que o Japão carrega é o domínio da atual situação de diminuição populacional e a sociedade muito envelhecida, em que uma mulher dá à luz a 1,4 crianças em sua vida.
A população japonesa já ultrapassou o seu pico e atualmente se encontra em torno de 126 milhões de habitantes e, no ano passado, teve uma perda populacional de 400 mil pessoas. Ainda, o envelhecimento populacional avança rapidamente, e uma entre quatro pessoas já são consideradas idosas com mais de 65 anos de idade. Cerca de 70 mil pessoas têm mais de 100 anos de idade.
Neste artigo, desejo tratar como a diminuição e o grande envelhecimento populacional afetam negativamente a sociedade e a economia do Japão, e como o país está tentando lidar com essa questão. Tenho a plena convicção de que o caso japonês servirá de exemplo aos países da América Latina que também enfrentarão esse mesmo problema.
O mundo observa atentamente a forma com que o Japão dominará esse desafio. O primeiro reflexo negativo da diminuição populacional e do grande envelhecimento da sociedade é a redução da demanda interna, e o Japão já se encontra em uma sociedade em declínio populacional e em tendência à diminuição do mercado interno.
Um dos empenhos realizados pelo governo japonês para resolver essa questão é o firmamento de acordos de EPA (Economic Partnership Agreement)/FTA (Free Trade Agreement). O Japão já firmou acordos de EPA com vários países da América Latina como o México, Chile e Peru. Dentro dessa conjuntura, infelizmente, os Estados Unidos se retiraram do TPP, que sob a liderança japonesa, entrou em vigor em 11 países.
Além disso, foi firmado e já entrou em vigor o acordo de EPA com a União Europeia, dessa forma, o Japão fechou acordos de Mega FTA seguidamente. Recentemente o Japão assinou o Acordo Comercial sobre Bens com os Estados Unidos. O Japão tem recebido por parte de vários países que compõem o Mercosul propostas de EPA que atualmente estão em avaliação. Dentro desse quadro de diminuição de demanda do mercado interno, o Japão trabalha para ampliar o mercado externo de empresas japonesas por meio de EPA.
Uma das importantes estratégias para a compensação da queda da demanda interna é a promoção do turismo no Japão aos estrangeiros. Nos últimos anos, o aumento de turistas estrangeiros que visitam o Japão é nítido. Em 2011, os turistas estrangeiros no país não passavam de 6,2 milhões; em 2017, foram mais de 28 milhões, e no ano passado, ultrapassou a marca de 31 milhões.
Isso significa que, nos últimos anos, esse número quintuplicou. A facilitação da emissão de vistos a chineses e a difusão do LCC é o pano de fundo desse aumento. Entretanto, segundo as estatísticas da Organização Mundial de Turismo (UNWTO), o Japão se encontra em 12ª posição em número de turistas em 2017, sendo o 1º lugar ocupado pela França com 87 milhões de turistas e em 2º lugar, a Espanha, com 82 milhões, o que significa que o Japão possui ainda uma vasta possibilidade de crescimento nesse campo.
O governo japonês estipulou como meta 40 milhões de turistas estrangeiros para as Olimpíadas e Paralimpíadas de Tokyo 2020, e para isso prepara a elevação da precisão tecnológica de tradução por voz para diversas línguas com o intuito de divulgar ao mundo o exemplo de uma sociedade sem “barreiras da língua”.
Podemos citar como segundo aspecto negativo da diminuição populacional e do grande envelhecimento da sociedade o grave problema da falta de mão-de-obra. Com a queda da natalidade, há a diminuição de jovens, e assim todas as empresas enfrentam hoje a crise da falta de trabalhadores.
Dentro dessa conjuntura, primeiramente existe o esforço para que mulheres e idosos participem do mercado de trabalho. Até então, muitas mulheres japonesas deixavam de trabalhar após o casamento ou o nascimento dos filhos, mas atualmente, o governo japonês vem reavaliando formas para que essas mulheres consigam continuar trabalhando mesmo nessas situações, aumentando o número de creches para que as crianças possam ficar durante o período de trabalho, estimulando assim a atividade profissional das mulheres.
Além disso, por serem muitos os idosos saudáveis, tem encorajado aqueles com vontade de continuar a trabalhar. O fato de o idoso continuar executando atividades profissionais é algo desejoso para manutenção de sua saúde física, possibilitando levar uma vida plena sem dependências de assistência médica. Ainda, existe um significado fundamental no engajamento de mulheres e de idosos no trabalho que é o aumento da base de sustentação da seguridade social.
A segunda estratégia para conquistar o problema da falta de mão-de-obra é o aceite de trabalhadores estrangeiros. Em abril, foi introduzida uma nova modalidade de visto para estrangeiros trabalharem no país que constitui uma política que visa o aumento desses recursos humanos.
Simultaneamente, para que os estrangeiros possam viver em simbiose com a comunidade local, estão sendo adotadas medidas para que haja uma provisão orçamentária de 21 bilhões de ienes (cerca de 200 milhões de dólares) destinados à saúde, à educação, etc. O terceiro ponto para solucionar a falta de mão-de-obra é a introdução da inteligência artificial (AI) ou a Internet das coisas (IoT). A grave falta de mão-de-obra na área de logística é proeminente.
Diante dessa situação, a utilização da tecnologia AI ou a IoT na construção de sistemas de veículos autônomos está relacionada à resolução da falta de motoristas. Estão surgindo hotéis com robôs-recepcionistas. Além disso, algumas lojas de conveniência estão realizando experimentalmente, de forma demonstrativa, o sistema de pagamento em caixas sem funcionários.
Existem opiniões de que o avanço desse tipo de sistema causará redução de postos, resultando em graves problemas de emprego; no entanto, há comentários de que com a introdução da AI ou a IoT, haverá diminuição no tempo trabalhado que se converterá em tempo de folga, aumentando assim a indicação de crescimento de emprego na indústria do turismo.
O terceiro reflexo negativo da diminuição populacional e da sociedade muito envelhecida é o aspecto social. Um grande problema que hoje chama a atenção é a possibilidade de motoristas idosos com habilidades de direção em declínio causarem acidentes automotivos e acabarem vitimando ou mesmo tirando muitas vidas inclusive de jovens.
Dentro dessa situação, além de avaliar com mais rigor a renovação da carteira de habilitação dos motoristas idosos, existe o esforço em prevenir acidentes de trânsito antes do acontecimento com a introdução de freios automáticos. Se os veículos autônomos forem introduzidos, será uma estratégia válida para evitar acidentes de trânsito causados por motoristas idosos.
Ainda, com avanço de uma sociedade muito envelhecida, há o aumento de mulheres idosas que moram sozinhas, e casos de golpes financeiros vitimando essas mulheres sempre persistem. No ano passado, foram movimentados aproximadamente 35,7 bilhões de ienes (330 milhões de dólares) em golpes vitimando pessoas desse perfil.
Ou ainda, existem os problemas graves de idosos que perdem o contato com a comunidade local e acabam morrendo de forma solitária. Há também aqueles acometidos por demência que, ao vagar, acabam se perdendo e se envolvendo em acidentes. A polícia, os órgãos governamentais e a comunidade local têm juntado esforços em atividades de proteção, trabalhando na prevenção desses casos infelizes.
Os negócios de cuidadores de idosos do Japão têm se expandido para a Ásia onde também ocorre o envelhecimento populacional. Ademais, para resolver o problema de aumento da demanda por cuidadores e a falta crônica de profissionais da área, estão em progresso o desenvolvimento e a normatização de equipamentos de robôs-cuidadores (vide planilha).
Em dezembro passado, o primeiro-ministro Shinzo Abe visitou a Argentina para participar da reunião do G20 e, com a finalidade de fortalecer ainda mais as relações com os vários países da América Latina, discursou sobre as perspectivas para o “fortalecimento da conectividade” entre o Japão e a América Latina, que são: 1. O fortalecimento da conectividade econômica; 2. O fortalecimento da conectividade de valores compartilhados e fundamentais como a liberdade, a democracia e o Estado de Direito; 3. A fortificação da conectividade de sabedoria a fim de resolver questões problemáticas por meio da exportação da inovação japonesa.
O Japão deseja compartilhar a experiência do empenho no domínio e na resolução das questões de diminuição populacional e de grande envelhecimento da sociedade por meio do fortalecimento da conectividade da sabedoria junto aos países da América Latina, que também enfrentarão futuramente questões semelhantes.