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No mundo

Javier Milei, o novo presidente da Argentina

07/12/2023 17:53
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Economista vence Sergio Massa no 2º turno e toma posse em dezembro para 4 anos de mandato. Entre suas propostas estão dolarizar a economia e fechar o Banco Central. Será? Economy&Law traz análise de especialistas e a cobertura do 7º Seminário Internacional de Líderes, e lança luz para perguntas que surgem coma eleição do ultradireitista

A Argentina elegeu, no dia 19 de novembro, Javier Milei como novo presidente do país. O deputado ultralibertário teve 15 milhões de votos, ou seja, 55,69%, 11 pontos percentuais à frente do rival Sergio Massa, que somou 44,30%, aponta a apuração. Com isso ele é o presidente da Argentina pelos próximos quatro anos. Ao votar, Milei disse que “tudo o que tinha de ser feito já foi feito” e a hora de as pessoas falarem tinha chegado, “apesar da campanha do medo”. O candidato da coalizão La Libertad Avanza disse que o momento era de esperança, para impedir o que chamou de “continuidade da decadência”. Economista, Milei se caracteriza por ser um candidato antissistema num país abalado por uma grave crise econômica, onde a inflação chegou a 142,7% nos 12 meses terminados em outubro. Ele promete dolarizar a economia e extinguir o Banco Central argentino para acabar com a inflação, mas amenizou outras promessas no segundo turno, prometendo não privatizar a saúde e as escolas públicas. Alçado à fama como comentarista econômico em programas de televisão, Milei se diz amante de cães e, segundo a mídia argentina, tem vários clones de um cachorro que viveu de 2004 a 2017. Embora tenha se aliado a políticos da direita tradicional no segundo turno, como o ex-presidente Mauricio Macri e a candidata derrotada Patricia Bullrich, o candidato vencedor atraiu o voto sobretudo dos mais jovens ao se posicionar contra aos políticos tradicionais, que chama de “a casta”. Durante a campanha, Milei foi comparado a políticos como o ex-presidente norte-americano Donald Trump e o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro. O futuro presidente argentino define-se como libertário e anarcocapitalista e declarou-se defensor de ideias como a comercialização de órgãos e a livre venda de armas. Durante o segundo turno, criticou o papa Francisco, a quem chamou de comunista.

Milei em campanha eleitoral pela Presidência

Brasil

Pelas redes sociais, antes mesmo da confirmação da vitória de Milei, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) parabenizou as instituições argentinas pela condução do processo eleitoral, bem como ao povo argentino pela participação “de forma ordeira e pacífica”.

Ministro da Economia

No dia 29 de novembro, Milei anunciou o nome mais esperado do governo – o ministro da economia. Ele nomeou Luis Caputo para a pasta. O novo titular tem fortes relações com o ex-presidente Mauricio Macri, de quem já foi ministro das Finanças e presidente do Banco Central. A entrada de Caputo gerou críticas dentro e fora de seu governo, porque com o embarque do novo ministro, agora o grupo de Macri, que perdeu nas urnas, é quem comandará a pasta mais importante do país. Esse é o jogo que Milei tem jogado para tentar conciliar libertários e a centro-direita de seu governo para garantir alguma governabilidade. Vale lembrar que Milei tem minoria no Congresso argentino. (Com Agência Brasil e informações da Agência Télam).

Professores especialistas analisam a vitória de Milei

Javier Milei ficou famoso como comentarista econômico em programas de televisão na Argentina e ganhou o apoio de políticos da direita tradicional no segundo turno, como o ex-presidente Mauricio Macri e a candidata derrotada Patricia Bullrich. O agora presidente argentino define-se como libertário e anarcocapitalista. Declarou-se defensor de ideias como a comercialização de órgãos e a livre venda de armas. Além disso prometeu dolarizar a economia e extinguir o Banco Central argentino com o objetivo de acabar com a inflação. As falas do presidente argentino acenderam sinal de alerta para os possíveis caminhos que a Argentina pode tomar em função de possíveis medidas extremas. A Economy&Law ouviu cinco professores especialistas de quatro universidades diferentes, que analisaram a vitória de Milei econômica e politicamente, assim a repercussão do novo governo da Argentina para a América do Sul. As relações com o Brasil, por exemplo, que são de extrema importância, especialmente no setor automobilístico, também é foco da análise a seguir.

MICHEL ROUBICEK, professor de Gestão Financeira da Fundação Vanzolini, da Escola Politécnica da USP

Para Michael Roubicek, professor de Gestão Financeira na Fundação Vanzolini, do departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP e sócio da 3Capital Partners, empresa de M&A, a situação na Argentina já é dramática, com uma inflação de mais de 150% ao ano e com uma perspectiva bastante nebulosa do que vai acontecer. “Eu não acredito na dolarização, por exemplo, pois o país está muito longe de ter a quantidade de dólares suficiente para implementar a medida. Muitas coisas teriam que dar certo para que o país começasse a gerar um fluxo líquido positivo de dólares suficiente para poder se mover em direção a uma dolarização”, afirmou. Integrantes da equipe econômica de Lula consideram que a vitória de Milei traz incertezas para o cenário regional e para o avanço de acordos comerciais, como a negociação entre o Mercosul e a União Europeia, especialmente porque o presidente argentino disse que o país poderia sair do bloco. O professor afirma que não é possível concluir que a vitória do economista argentino trará consequências, pelo menos por enquanto. “A verdade é que não sabemos, existe uma incerteza muito grande sobre o que vai acontecer com relação ao Mercosul. Eu não acredito em uma ruptura a curto prazo, pois o Brasil é um parceiro comercial extremamente importante para o Argentina, que exporta cerca de US$ 13 bilhões para o Brasil, sendo uma fonte relevante de dólares. Muitas coisas que são ditas durante a campanha são somente isso: campanha eleitoral. Mas aplicar tudo isso na prática será um problema enorme e não creio que tenha apoio dos empresários, que são parte importante da base de apoio de Milei, para sair do Mercosul”.

JOSILMAR CORDENONSSI, professor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA)

Na visão de Josilmar Cordenonssi, professor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, é difícil que o novo governo argentino esvazie o Banco Central e suas atribuições. “O presidente eleito e seus assessores vão notar que os melhores técnicos estão no Banco Central e que podem se apoiar neles para criar medidas que solucionem os problemas da economia Argentina no curto, médio e longo prazos. Quanto à ideia da dolarização da economia, ele acredita pouco provável que aconteça. “Se for implementada a dolarização, o que eu acho muito pouco provável, você vai perder a parte de política monetária do Banco Central, mas você tem aí outros papeis que o Banco Central exerce – na eleição não se falava nada – que é a questão da regulação dos bancos e também de você dar toda uma estrutura para reduzir o risco sistêmico da economia argentina. Acredito que eles não vão acabar com o Banco Central, mas também não vão dar independência ao Banco Central, porque parece que ele [Milei] não é uma pessoa ligada à criar instituições, de que as instituições têm de se fortalecer para que a economia se fortaleça”. Questionado sobre o caminho ideal, que o governo pode seguir para tentar aplacar a crise, o professor diz não acreditar na dolarização como alternativa. “Não acredito que a Argentina possa dolarizar a economia porque simplesmente ela não tem dólares. As reservas são negativas. Ela não tem condições hoje, apesar de toda situação caótica, está tendo déficit de transações correntes ainda alto e não tem como se financiar”.

AHMED EL KHATIB, coordenador do Instituto de Finanças da Fecap

O coordenador do Instituto de Finanças da Fecap, Ahmed El Khatib, avalia que a principal proposta econômica de Javier Mile, que é a dolarização da economia, é “absurda”. A proposta de dolarização de Milei ganhou força na Argentina devido à esmagadora procura por estabilidade macroeconômica, após mais de uma década de inflação de dois dígitos. A inflação anual da Argentina arrefeceu para 113,4% em julho de 2023, contra 115% junho [a inflação hoje está em 142,7%]. Este foi o nível mais elevado desde 1991. De acordo com algumas projeções, a taxa de câmbio deverá descer mais 70% nos próximos meses. “Acredito que a dolarização não é viável no curto prazo. A Argentina não tem dólares para dolarizar e não tem acesso ao mercado financeiro para obter dólares. Essa proposta de dolarização só causaria a injeção de mais títulos argentinos nas mãos do setor privado internacional, direta ou indiretamente, reduzindo assim ainda mais o valor dos títulos argentinos. Mesmo que a dolarização de uma economia de mais de US$ 600 bilhões pudesse ajudar rapidamente a reduzir a inflação, trata-se de um processo altamente dispendioso”, diz El Khatib. O professor afirma ainda que “a ideia do presidente eleito e dos seus economistas é de que o povo argentino tem mais de US$ 200 milhões em poupanças e depósitos estrangeiros e em outros lugares. Quando esse dinheiro entrar em circulação, por exemplo, para pagar impostos, o Tesouro do país teria automaticamente moeda disponível para avançar com o processo, sem a necessidade de reservas no Banco Central”.

RODRIGO LEITE, professor de Finanças e Controle Gerencial

Para Rodrigo Leite, professor de Finanças e Controle Gerencial da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é possível que esteja havendo uma supervalorização de Milei, no sentido de que haja consequências regionais, por ser um político de extrema direita. “Acredito que as pessoas estão supervalorizando o efeito que isso vai ter para a economia regional. O Brasil é o terceiro maior parceiro comercial da Argentina. Do mesmo jeito que o Milei não vai acabar com o comércio com a China, que é o segundo maior parceiro comercial, também não vai acabar com o Brasil, o segundo maior parceiro comercial. Então, assim como o Brasil tem posições completamente, em alguns pontos, antagônicas com os Estados Unidos, e nem por causa disso a relação Brasil-Estados Unidos e o comércio com os Estados Unidos foram afetados. Mesmo na época do governo Bolsonaro, havia posições antagônicas, muitas vezes, com a União Europeia, e nem por causa disso o comércio entre Brasil e União Europeia foi afetado”, afirma. Sobre a crise econômica e as possibilidades de Milei para aplacá-la, na visão do professor é difícil dizer ainda. “Se fosse adotada uma política ortodoxa de aumentar a taxa de juros para poder fazer com que as pessoas mantenham o peso, tentar estabilizar o câmbio, fazer a privatização de diversas empresas para que o governo conseguisse arrecadar dólares, renegociar com FMI para também arrecadar dólares, para usar isso e tentar manter a taxa estável, isso poderia ter efeito. Agora tudo isso passa por ter um Banco Central que não é a política que o Milei falou que ia implementar, ele ia acabar com o Banco Central, que é uma autoridade monetária importante para você estabilizar os preços”, considera.

ARIANE RODER, cientista política especialista em Relações Internacionais

A análise da professora Ariane Roder, cientista política especialista em Relações Internacionais da UFRJ vai no sentido de entender as eleições de figuras como Trump, Bolsonaro e, no geral, o empoderamento de políticos de extrema direita mundo afora. “O que explica a eleição de figuras pitorescas, com discursos extremados, em países de alta relevância estratégica, como foi o recente caso da Argentina com a vitória do ultradireitista Javier Milei?” Para ela, a resposta está na história. “A emergência ao poder de personagens com esse perfil ocorre em contexto de grave crise econômica, ou seja, com altas taxas de inflação, desemprego e sem perspectiva de que os tradicionais partidos e lideranças políticas, que assumiram o poder ao longo de décadas no país, consigam resolver o problema. Então a culpabilidade dessas lideranças ou desses partidos para a atual situação do país, leva a busca por pessoas, por outsiders, quem não estejam envolvidos dentro disso e também por propostas que saiam do mesmo”. Por outro lado, para ela, ao mesmo tempo que o cidadão elege uma liderança com discurso extremado, com propostas bastante diferenciadas e pouco palatáveis ao gosto do grande público, esses mesmos eleitores não apostaram em um Congresso afinado com essas propostas de Milei, ou seja, ele não terá maioria no Congresso e, para construir, inevitavelmente terá que negociar. “Do contrário, haverá o que a gente chama de paralisia decisória, que é o pior de todos os cenários, pois é quando o presidente propõe uma agenda ao parlamento e as coisas não saem conforme, obviamente, planejado”.

Nesse caso, então, continua a especialista, “das duas, uma, ou a gente vai ver na Argentina, sob o ponto de vista de política doméstica, uma paralisia decisória, no qual terá dois poderes, o Legislativo e o Executivo, propondo coisas em caminhos distintos, ou, inevitavelmente, o presidente vai ter que ponderar os seus discursos, diminuindo a rigidez das suas propostas, de modo a conseguir formar algum tipo de maioria, mesmo que não sólida, para atingir alguns dos seus objetivos políticos”. Já no campo da política externa, essa dificuldade será menos sentida por Milei, já que parte significativa das competências nesse campo são de exclusividade do chefe do Executivo, ou seja, no campo internacional há menos barreiras para evitar rupturas. “Além disso, no campo diplomático os discursos têm poder de comprometer significativamente parcerias e relações nas mais diversas áreas”. Assim, de acordo com a professora Ariane Roder, um dos impactos potenciais de serem sentidos será na relação com o Brasil e na própria história do Mercosul. Segundo a professora, a sinalização dele quanto a saída da Argentina do Mercosul é um passo difícil devido a isso inevitavelmente precisar da aprovação do Congresso, o que pode não acontecer. No entanto, o que ele pode fazer é algo parecido com o que fez o governo anterior do Brasil de Jair Bolsonaro, que nos últimos quatro anos esfriou a relação com os países do bloco. “O Mercosul ficou em stand-by ao longo do governo Bolsonaro que apostou mais nas relações diplomáticas de caráter bilateral, dando pouca atenção ao Mercosul, ou seja, o Brasil não interrompeu as relações com seus vizinhos, mas ao mesmo tempo também não as intensificou”, diz.

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